sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Ninguém come!

[desculpe o termo empregado, mas é para a transcrição fiel da história de Otávio e Rosa.]

Otávio era um cara muito possessivo. Filho único, nunca aprendeu a dividir o que é seu. E não foi diferente quando ele conheceu suas namoradas.

Apesar de ser egoísta com suas namoradas, nenhuma foi muito especial pra ele. Exceto uma. Essa mudou completamente a vida de Otávio. Seu nome era Rosa e ela despertava os instintos mais selvagens do namorado.

Por causa da sua característica que já lhes apresentei, Otávio era muito ciumento e não deixava que nenhum par de calça colocasse os olhos em sua joia rara. Muitas vezes Ro-as viu Otávio discutindo com outros rapazes por sua causa. Às vezes, saia até socos e pontapés.

No início, Rosa achava isso romântico, uma prova do verdadeiro amor. Depois, foi fi-cando constrangedor. Otávio tinha ficado paranoico por causa do ciúme e aonde ele chegava as pessoas já iam dizendo.

— Ih, o Otávio chegou. O barraco vai começar.

Rosa ficava envergonhada e terminar o namoro estava fora de cogitação.

Otávio, então, pegou uma mania de beber. Foi aí que arranjou alguns amigos que ele confiava. O melhor deles era Júlio. Os dois eram como irmãos. E, nas festas, agora, com o álcool, Otávio gostava de gritar aos quatro ventos:

— Minha namorada, a Rosa, ninguém come. Só eu. Ninguém come.

Rosa ficava vermelha, mas não tinha nada que pudesse fazer. Tinha medo de terminar o namoro e Otávio aparecer na porta da sua casa no dia seguinte com uma carabina e mu-nição.

E essa situação constrangedora continuou por muito tempo.

— Ninguém come. Ninguém come.

Até o dia do acidente.

Otávio arranjou um carro emprestado e levou Rosa para passear na cidade. Não pensem que ele se esqueceu do Júlio. Pois é! O amigo de cachaças e cervejas estava no banco de trás.

Otávio já tinha tomado umas e não estava muito bem. Ria e não prestava atenção em nenhum carro que passava. Foi um caminhão carregado de toras que topou com o carro do nosso personagem. O carro teve perda total.

Júlio foi hospitalizado, Rosa sofreu apenas uns arranhões de perigo médio e Otávio morreu na hora.

Rosa sentiu-se um pouco triste com a morte do namorado, mas sentiu-se aliviado, ao mesmo tempo. Estava livre do Otávio.

Quem a conhecia percebeu o quanto ela estava mudada: mais alegre, mais corada e mais extrovertida. Foi num desses forrós à noite, que Rosa descobriu-se apaixonada por Júlio. Ela achou irônico ter notado a beleza daquele rapaz apenas depois daquele trágico aci-dente.

Começaram a namorar e estavam sempre de mãos dadas nos forrós, nos bailes e nas quermesses. Júlio não bebia mais e Rosa dançava até altas horas da noite.

— Olha como Rosa está mudada depois da morte daquele traste.

Uma noite, Júlio resolveu levá-la para passear na cidade. Seria uma noite romântica: a primeira noite de amor do novo casal do arraial. Rosa estava nervosa e Júlio estava an-sioso.

Júlio pegou um carro emprestado e seguiu para a cidade. Tinha chovido. Foi por causa desse pequeno detalhe que o rumo da história foi retraçado. O carro girou na rodovia e um caminhão em alta velocidade acertou em cheio o lado do motorista. Júlio achou que morreria.

Não! Júlio só fraturou o braço. Enquanto Rosa, que estava no banco do passageiro, mor-reu na hora.

Isso rendeu muita história no arraial.

Até hoje, dizem que Otávio buscou Rosa para cumprir sua promessa: Ninguém come! Ninguém come!

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