sábado, 19 de fevereiro de 2011

Na funerária com um chicote

Se alguém me perguntasse o motivo eu não saberia responder. Então... não me perguntem. Eu, Beto, fui trabalhar numa funerária. Isso mesmo!

O trabalho era até fácil. O meu patrão, o Sr. Elias, e outro funcionário eram os encarregados dos... presuntos. Eu ficava lá no balcão, onde é meu lugar, atendendo aos clientes que às vezes chegavam aos prantos pedindo por um terno de madeira. Quer dizer, um caixão.

Não era a coisa mais agradável de se fazer, mas... Eu não me lembro. Talvez o salário fosse bom demais para eu dispensar. Sim, o Sr. Elias ganhava muito. Claro! Todos os dias tem gente morrendo. Se abrirmos um comércio pensando no que as pessoas precisam todos os dias faremos dinheiro fácil fácil.

Um dia, então, o Sr. Elias precisou viajar. Seria uma viagem rápida. Lá pelas cinco da tarde ele estaria de volta.

Eu senti um calafrio quando eu fiquei sozinho naquela funerária fria, solitária, vazia...

— Não está vazia — eu disse em voz alta para me acalmar. — Está cheia de... caixões.

Era melhor eu ficar calado.

Eu estava mexendo em qualquer coisa. Quando me virei, havia um casal todo de preto às minhas costas. Eu dei um grito de susto e quase derrubei uma mesinha atrás de mim.

— P-pois não! — eu disse.

Foi difícil distinguir o sexo de cada um, mas eu posso fazer uma descrição deles. O homem era muito magro, tinha os cabelos grandes, nenhuma barba no rosto, os olhos pintados de lápis, uma roupa toda preta com correntes e caveiras penduradas. A mulher... a mulher era muito parecida. Peraí! Qual era mulher, mesmo?

— Queremos um caixão — um deles pediu.

Eu quase perguntei: “Pra qual dos dois?”.

— É... você tem... alguma preferência? Tamanho... material...

Bem grande! Precisa caber nós dois.

Jesus, Maria e José!

— Ahn?!

— É um fetiche nosso. Você sabe, né?

— Não. Não sei, não!

— A gente tem o fetiche de... fazer...

— Sexo dentro do caixão — a mulher completou. — A gente ia tentar o cemitério, mas ficamos com medo de sermos presos por violação de sepultura. É violação de sepultura, mesmo? Ah, sei lá! Não importa! E aí, gatinho, vai liberar pra gente?

Eu não sei do que eu fiquei com mais medo: se foi eles terem pensando em abrir uma sepultura para fazerem sexo dentro dela ou se foi ela me chamar de “gatinho”.

— Não seria melhor vocês... procurarem um motel?

— Você conhece algum motel que ofereça caixões?

— É... não, mas...

— A gente paga bem.

O homem tirou um maço de notas do bolso e me entregou. Eu senti que o capeta estava me tentando. Logo, eu me vi dizendo:

— É... De quanto tempo vocês precisam?

— Só uma meia horinha. Pra não poder prejudicar você com seu patrão.

Eu não quero nem saber de patrão.

— É... outra coisa: vocês querem que eu fique lá de fora, ou eu posso ficar nesse balcão aqui. Eu vou ficar de costas, vou colocar um fone no ouvido...

— Você pode até participar, se quiser — a mulher disse enquanto tirava um chicote da calça.

Eu sorri dizendo “Obrigado”.

Já estavam lá dentro há uns quinze minutos — O negócio tava bom! — quando o Sr. Elias apareceu lá na rua, descendo do seu carro.

— Por que essas coisas acontecem comigo, meu Deus?

O Sr. Elias entrou na funerária.

— Como foram as coisas na minha ausência?

— Ótimas! — eu disse empurrando o Sr. Elias para a rua. — Só apareceu um padre pra benzer a funerária. Ele está lá dentro, agora.

— Padre?!

— Pois é! Essas coisas são meio estranhas, né?

— Deixa eu conferir essa história.

— Espera!

Não deu pra segurar o Sr. Elias. Fiquei imaginando em que posição aqueles dois estariam agora. Deve que eles trouxeram, além do chicote, um machado e um maçarico.

— Cadê o padre? — o Sr. Elias perguntou. — Não tem ninguém aqui.

Eu olhei desconfiado dentro da sala dos caixões e dei uma olhada disfarçada dentro deles. Onde aqueles dois tinham se metido?

— Ele saiu — eu disse com incerteza. — Agora, que eu lembrei.

— Fique mais atento da próxima vez, Beto.

Eu sorri amarelo.

Coloquei a mão dentro do bolso e o maço de notas ainda estava lá dentro, mas a maneira estranha como aqueles tinha desaparecido me deu medo. Eu tinha pensado em comprar um tênis e algumas roupas, mas eu me imaginei vestindo as minhas roupas novas e aqueles dois apareceriam no meu e quarto e... Não quero nem imaginar!

Dei o dinheiro pra igreja. Lá era um lugar do bem.

E larguei o emprego. Era melhor deixar os mortos descansarem em paz.

Um comentário:

Clara disse...

Oi! Adorei o layout novo! Pena que está com um probleminha ali do lado...

Ai gente, que história heim? Acredito que existam pessoas assim mesmo. Eu nunca vi, mas aposto que tem gente que tem até caixão em casa. Cada doido com sua mania... Eu no lugar dele ficava com o dinheiro, só pelo aperto e pelo medo! ashuahsua