sábado, 31 de dezembro de 2011

100 palavras para se lembrar de 2011




Dona Norma

Pitbull

Game of Thrones

Hebe

USP

Born this way

7 bilhões

Agora é tarde

Joana Machado

Rafinha Bastos

Pereirão

Amanhecer

Harry Potter e as Relíquias da Morte

Anderson Silva

Amor e Revolução

Patrícia Poeta

11 de setembro de 2011

As Esganadas

Obrigada, Nazaré

Criolo 

Osama Bin Laden

Itamar Franco

Adele

Príncipe William e Lady Kate

Fukushima

Líbia

Realengo

Muammar al-Kadhafi

Beato Papa João Paulo II

Amy Winehouse

Rock in Rio

O Palhaço

Banda UÓ

Medida Certa

Cláudia Leitte

Que deselegante

Steve Jobs

O Melhor do Mundo

Colin Firth

Kim Jong-II

Reynaldo Gianecchini

iPad-2

Cisne Negro

Belo Monte

Euro

Discurso do Rei

Guadalajara

Luís Inácio Lula da Silva

Grécia

Ai, como eu tô bandida!

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Ângulos



“No mesmo instante em que Mello Noronha tenta acender um dos temíveis charutos, sua bela dona Yolanda adentra o gabinete. Está deslumbrante, num tailleur azul-escuro estilo Chanel, boina da mesma cor, o pescoço enfeitado por um fio de pérolas. Ato contínuo, Noronha apaga o fósforo e guarda o Panatela. Esteves levanta-se para saudá-la:

— Imenso prazer em revê-la e, se o marido me permite o elogio, linda e elegante como sempre.

— Nem tanto. Preciso perder dois quilos.

Tobias Esteves pontifica sobre o assunto:

— Senhora dona Yolanda, se me permite, sua declaração tem uma característica universal. Toda mulher do mundo acha que precisa perder dois quilos. O que disse já foi repetido em todas as demais línguas faladas no dito mundo civilizado. Sabe como a mulher chega a esta conclusão? Observando-se nas fotos. No espelho, ninguém se vê como realmente é. Diante do espelho, acontece uma correção inconsciente do corpo, e ela apresenta o melhor ângulo de si mesma. Numa fotografia, as pessoas aparecem chapadas no papel. Ninguém faz de si uma imagem real. Nos achamos um pouco melhores do que somos. Por isso é tão comum ouvir-se a frase: ‘Estou horrorosa nesta foto!’. Geralmente, não é verdade. De modo que posso garantir à senhora, dona Yolanda, que a sua beleza é irreprochável.

— Muito obrigada, seu Tobias, mas a verdade é que eu preciso perder dois quilos.”

Trecho do livro “As Esganadas” de Jô Soares

sábado, 24 de dezembro de 2011

Pedido de Natal


Entrar no shopping era como mergulhar num mar de luzes coloridas que piscavam esquizofrenicamente. As lojas oferecem as melhores condições de pagamento, querem aproveitar o seu 13º e estão todas decoradas de verde e vermelho.

Um Papai Noel está sentado no centro do shopping esperando que as crianças se postem ao seu lado (ou sentem no seu colo), façam seu pedido, tirem uma foto e saiam satisfeitas com o seu Ho-ho-ho!

Um menino de cabelos enrolados, olhos esbugalhados e um sorriso babão estava encantado com a chance de poder fazer seu pedido direto para o Papai Noel.

— Pai, ele veio do Pólo Norte?

— Veio, meu filho — o pai respondeu.

Era a vez do menino subir no colo do Papai Noel. Ele correu e deu um salto que foi amortecido pelo enchimento na barriga do ator contratado: um estudante de teatro que dividia o quarto da república com três colegas e tentava sobreviver com os auxílios da universidade.

— Papai Noel, eu fui obediente o ano inteiro! — o menino disse orgulhoso.

— Ho-ho-ho! Então, essa é a hora de você fazer o seu pedido. Quem sabe eu não entrego o seu presente pessoalmente na noite de Natal!

O menino ficou calado.

— Diga, meu filho — o Papai Noel o incentivou —, qual é o seu pedido?

— Papai Noel, eu quero mil reais!

— Ho-ho-ho! — Foi uma risada sincera. Aí, o Papai Noel ficou sério e disse pro menino: — Todos querem, meu filho. Todos querem...

O menino saiu do shopping com uma foto na mão sem entender o que o Papai Noel quisera dizer.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Pensamentos mórbidos



Não sei se isso é saudável, mas pensar na nossa própria morte é uma coisa, no mínimo, interessante. O meu cansaço deve ter contribuído para esses pensamentos mórbidos, mas, nessa última noite, eu sonhei com a minha morte e as reações das pessoas.

Pensei primeiro na minha amiga Ana Paula, que foi minha companhia principal nas últimas 48 horas. Ela contaria pra todo mundo o quanto eu estava animado na quinta-feira quando fomos beber e dançar; ela contaria o quanto eu fiquei emocionado com o coral de Natal na sexta de manhã e o quanto eu me dediquei para escolher presentes no shopping. A Ana também seria responsável em explicar o monte de coisas que eu tinha comprado: esse presente é pra tal pessoa, esse outro é o do amigo oculto... Com lágrimas nos olhos, ela sorriria lembrando-se dos nossos infortúnios dentro do ônibus.

Logo em seguida, lembrei-me de mais duas amigas: Nathália e Gabriela. A Nathália ficaria com remorso por não ter me acompanhado nas compras de Natal e a Gabriela ia comentar com todo mundo o quanto eu parecia feliz no bate-papo do Facebook.

Por último, lembrei-me do meu amigo Igor, que eu não vejo desde julho, que ficaria olhando para a tela do seu celular olhando a mensagem que eu tinha lhe enviado na quinta-feira! E ficaria arrependido de não ter me feito algumas perguntas pessoais antes.

Pode parecer idiota para quem está lendo, mas, com isso, eu me lembro de uma coisa que eu sempre digo e que revela um traço da minha personalidade: eu sinto necessidade de ser lembrado. Talvez seja por isso que eu às vezes sinto necessidade de ser extravagante.

Esse relato, em que eu transformei os meus amigos em personagens — como se eu conhecesse os sentimentos mais íntimos deles —, é só um desejo inconsciente. Sim, desejo. Porque eu quero ser lembrado. Não tem nada mais egocêntrico do que isso, mas eu só estou abrindo meu coração.

E eu ainda me lembrei de um diálogo entre eu e outro amigo: 

— Porque, quando alguém morre, tem pelo menos uma pessoa pra chorar por ela — ele disse.

— Ah, eu quero que os outros chorem no meu velório — eu respondi.

— Eu não — ele completou. — Quero todo mundo alegre.

Aí, eu já não sei se eu quero que as pessoas chorem ou festejem no meu velório. Só quero ter pessoas pensando em mim quando eu me for. Na verdade, prefiro pensar como Chico Xavier: “Se não quiser chorar, não chore. Se não conseguir chorar, não se preocupe. Se tiver vontade de rir, ria.”

Minha mãe já teria me mandado calar a boca, mas... Gente, todo mundo vai morrer! Por que conversar sobre uma notícia de jornal é diferente de conversar sobre a minha morte? A morte é minha, uai!

O mais louco é que, depois da morte, nosso corpo se torna responsabilidade de pessoas que, às vezes, nunca tínhamos visto antes. Nós já não teremos mais controle sobre as nossas vontades; as pessoas farão as escolhas por nós. Aí vem uma coisa muito tensa e eu vos peço:

Gente, pelo amor de Deus: coloquem uma foto descente na minha lápide!

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Uga-uga-rá


[eu não sei de onde tirei isso²]

Os dois estavam sozinhos, perdidos numa praia deserta. Não tinham a mínima ideia de como voltar.

— A culpa é toda sua por me passar raiva. Acabamos perdidos — disse o primeiro.

— Você que é leso e fica pondo a culpa em mim — disse o outro. — E eu ainda tenho uma pederneira. Vou ser bonzinho e te livrar dessa também. Vou botar fogo nessa mata toda. Alguém vai encontrar a gente.

— Tenho certeza que, se você tivesse um bote que só coubesse uma pessoa, você não me livraria dessa.

— E você faria diferente?

— Mas você me deve dinheiro!

— Só por causa disso eu deveria te salvar? — o outro diz tentando usar a pederneira. — É... como é que usa isso aqui mesmo?

— Nossa, mas você é um herói mesmo, hein.

De repente, uma chuva de flechas. Uma acertou a panturrilha de um; outra acertou os fundilhos do outro. Caíram desmaiados.

— Ih, mas a minha carne é muito ruim!

Agora, os dois estavam amarrados em árvores separadas, com os braços para trás, sem camisa, com as testas marcadas de vermelho. Enquanto isso, os membros da tribo preparavam o ritual: uns esquentavam a água no caldeirão, outros cantavam e dançavam o Uga-uga-rá!

Os membros da tribo se pintavam de preto com listras verdes e vermelhas imitando répteis da mata. Também tinham pintas brancas no rosto. Balançavam chocalhos e, nos pés, as conchas amarradas produziam sons.

— Uga-uga-rá!

E os capturados se preparavam (se é que isso é possível) para serem cozidos vivos:

— A minha carne é muito dura. Vocês precisam d’um amaciante de carne. Vocês tem isso aí?

— Uga-uga-rá!

— Esquece, cara! — o outro aconselha. — Essa gente não entende nossa língua. Eles são um bando de ignorantes!

— Talvez eles te soltem também...

— Eu não preciso da sua ajuda.

— Do mesmo jeito que você  não precisou de mim com a pederneira? Tudo bem, então. Na verdade, eles vão ver a bondade na minha cara. Eu tenho filho pequeno pra criar! Diferente de você, canalha!

— Canalha? Eu também tenho filho pra criar.

— Não tem, nada! Já chega de mentiras. — Ele tenta alcançar o outro para chutá-lo. — Você é um enganador barato. Me devolve meu dinheiro, seu desgraçado!

— Uga-uga-rá!

— Eu vou te pagar. É só ter paciência.

— Paciência?! Você está me pedindo para ter paciência há mais de um ano! Me devolve meu dinheiro!

— Olha, já que a gente vai morrer mesmo... Eu nunca vou te pagar. Nunca nem pensei nisso. 
Pronto, falei.

— Uga-uga-rá!

— Seu filho da mãe!

— E pra que você precisa de dinheiro agora? Vamos morrer de qualquer jeito. Você nunca foi à missa e ouviu o padre dizer que da terra não levamos nada...

— CALA A BOCA! Eu tenho filho pra criar, seu cretino.

— Mas ele também tem mãe.

— Claro! Eles não são filhos de parideira. E ela precisa de mim também. A gente se ama.

O outro ri.

— Nessa hora, ela deve estar na sua cama com o Ricardão.

— Uga-uga-rá!

— Ela não é como a sua mãe! — Vira-se para a tribo: — Eu preciso criar meu filho. Deixa eu ir embora.

— Você acha que esses índios pelados e analfabetos vão entender o que você fala? Isso aí é que nem bicho.

— Nóis entender o que cara pálida fala.

O outro engole seco.

— Nóis não ser bicho — o cacique continua. — E nóis não gosta de traidor. — Vira-se para alguns jovens da tribo: — Solta o que tem filhote.

— Como assim? E eu?

— Ir pro caldeirão. Nóis não soltar traidor.

Ele ainda alimenta uma última chama de esperança.

— Cara, me tira daqui. Chama ajuda. Pel’amor de Deus!

O outro diz enquanto se livra das cordas:

— O que foi que você disse agora há pouco? Que não precisa da minha ajuda, não é?

— Mas agora é diferente.

Mas o que está livre já está rindo e correndo para longe. Ainda se vira e grita de longe:

— Bom apetite!

domingo, 4 de dezembro de 2011

A Gorda



[ou “A Rechonchuda” para os politicamente corretos]

Não tenho nada contra quem está acima do peso e essa história nem é tão interessante quanto outras, mas, se alguém me perguntasse o motivo de eu ter gasto o meu tempo com essa gorda, eu responderia... Não sei! Na verdade, eu nunca tinha vista mais gorda. Mas ela é uma daquelas personagens que eu encontro na rua e não me saem da cabeça. É uma das personagens que precisam ter suas histórias contadas.

Cinco horas da tarde e o sol está insuportável! Não é como o sol quente do meio-dia, é um sol que entra por todos os nossos poros e nos impede de respirar. É um mormaço que faz com que você chame todos os santos para que o ônibus chegue o mais rápido possível; é um mormaço que faz com que você se sinta como se estivesse numa estufa de boteco de esquina.

E foi justamente de uma dessas estufas que saiu o salgado que a gorda comia. Sentei-me ao lado dela no ônibus enquanto ela mordia o risole e bebia guaraná. O óleo ultrapassava o guardanapo fino e escorria entre seus dedos roliços, enquanto o cheiro de fritura entrava pelas minhas narinas quase impossibilitadas de respirar por causa do calor. Aquilo me revirava o estômago.

Ela terminou o salgado e limpou os dedos no guardanapo quase transparente e bebeu o resto de refrigerante numa única chupada no canudinho. O ônibus se aproximava do ponto em que ela deveria descer e eu atrapalhava a sua passagem. Ela se virou para mim e disse mal-humorada:

— Sai que eu quero descer!

Educação mandou lembranças... Saí como ela tinha mandado e quase pedi desculpas por eu existir. E ela desceu com a mesma cara amarrada e com a mesma delicadeza com que ela tinha me pedido passagem.

Para terminar, uma menininha de uns 6 anos gritou:

— Olha, vó! É aquela mulher ali, ó. É mais gorda que a senhora.

Ai, ai... a sinceridade das crianças.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O Fruto Proibido



“O tempo não foi a única novidade trazida por Eva ao jardim do Paraíso. Foi ela que, dias depois, colheu o fruto proibido , que os tornou, de uma só mordida, sexuais e mortais. E foi depois de comer o fruto proibido, quando a Terra entrou na sombra da noite e os dois se deitaram lado a lado, que Adão sentiu seu membro, que ele pensara que fosse só para fazer xixi, se mexer. E avisou à Eva:

— É melhor chegar para trás porque eu não sei até onde este negócio cresce.”

Em algum lugar do paraíso, Luís Fernando Veríssimo

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Levaram a carteira!


Um menino feliz e serelepe resolveu ir à Biblioteca Municipal estudar para um trabalho. Depois de dois ônibus e um pouco de caminhada, chegou animado ao lugar. Abriu os cadernos, as apostilas, pegou um dicionário na prateleira e tudo corria bem.

Um ventilador no canto da sala de estudos esvoaçava algumas folhas em cima da mesa do menino. Ele colocou sua carteira de couro e seu celular sobre as folhas para que não voassem. Tudo corria bem.

Mas é segunda-feira... depois do almoço... dá aquela sonolência... as letras começam a embaralhar... a gente já não consegue assimilar tudo que está lendo. E esse menino resolveu dar um cochilo em cima dos cadernos. Quinze minutos não é nada! E deitou sobre os braços.

Quando acordou, pegou o celular e conferiu as horas: 15hrs. Mas... tá faltando alguma coisa no cenário... A CARTEIRA!

É difícil admitir, mas esse menino sou eu. Hoje à tarde.

Eu fiquei desesperado. Não é possível que eu tenha perdido minha carteira com documentos, cartões de crédito, cinco fotos 3x4 e três notas de R$2!

Saí perguntando às outras pessoas que estavam por ali. Alguém tinha que ter visto alguma coisa:

— Uai, tinha um homem moreno de camisa azul andando por aqui. Ele tava muito suspeito.

Como assim, gente? Como que é uma pessoa suspeita? Eu não vou acusar o homem só porque ele é moreno.

Cheguei numa das bibliotecárias e disse:

— Que que eu faço? Tenho que fazer um boletim de ocorrência! Liga pra polícia. Eu tô ferrado.

Vendo o meu desespero, um rapaz, que eu descobri se chamar Marcelo, disse que viu esse mesmo homem moreno de camisa azul mexendo nas minhas coisas, mas ele achou que ele estava comigo.

— Ow, cara, desculpa aí!

— Naaaaada! A culpa não foi sua, não!

E eu andando de um lado pro outro. Por fora eu era só um rapaz discreto que tinha perdido a carteira, mas por dentro eu queria gritar e fazer um barraco imenso dentro da Biblioteca. 
Dramático!

Os policiais chegaram, eu me apresentei e eles começaram a preencher o BO:

— Sua identidade, por favor.


— Er... moço, levaram minha carteira.

— Ah, é! Você sabe o número de cor?

E ele me fez um monte de perguntas. Dentre elas:

— Me conta o que aconteceu direito.

Eu falei tudo: estudo, sono, carteira e celular em cima dos papéis, a falta de alguma coisa. Foi 
nessa hora que uma bibliotecária, que não tinha nada a ver com nada, entrou no caso:

— Uai, mas, se o celular tava ao lado da carteira, por que ele não levou o celular também?



Por fora eu fiz essa cara, mas por dentro eu quis dizer:

— Essa pergunta é meio difícil de responder, né. A senhora não quer ligar pro ladrão, não? E isso não vem ao caso agora!

A entrevista continuou. Contei da testemunha.

— Ah, teve testemunha. Então, chama ele.

Eu fiquei tão grato pelo Marcelo ter ido me dizer o que tinha visto e ainda por cima ter me pedido desculpa que eu disse que não tinha necessidade de ele prestar depoimento.

Eu não era capaz de fazer uma descrição do ladrão já que eu estava dormindo a centímetros do furto, então a bibliotecária que tinha me prestado auxílio foi chamada.

— Ele é moreno, negro de cabelo liso.

— Negro do cabelo liso? — o policial riu. — Difícil, hein!

Eu lá desesperado com os meus cartões nas mãos de um desconhecido e o homem ainda faz 
piadinha. O pior foi a lição de moral:

— Da próxima vez, você presta mais atenção. Se você sabe que vai deixar a carteira largada por muito tempo, coloca ela no bolso ou na mochila. Não pode se desligar desse jeito.

Isso foi só a introdução. Eu senti que ele tava querendo jogar a culpa em cima de mim, mas... deixei pra lá. Ainda jogaram a culpa no Marcelo, que viu tudo, mas nada fez. Eu fiquei com raiva! A culpa não era minha nem do Marcelo. Nós não fizemos nada de errado. O culpado é o ladrão que pegou minha carteira, ora!

E quando eu fui agradecer ao Marcelo, ele me perguntou:

— Ow, cara, tu não precisa de um dinheiro aí, não? Pra tu voltar pra casa?

Fiquei até emocionado. Ainda existem corações bondosos nesse mundo.

Mesmo assim, não tinha mais clima pra estudar. Fui embora e todo homem moreno, de cabelo liso e camisa azul me chamava a atenção. Eu quase abordei um eletricista.

Agora, todo mundo tá tentando me consolar dizendo que não faz sentido esse homem continuar com essa carteira. Não tinha dinheiro (esculacha mesmo)! Ele vai devolver a carteira pra Biblioteca!

E eu? Fico só esperando, né. Sentado. Pena que eu não sei o nome do ladrão, porque senão eu já estaria seguindo ele... no Twitter.

P.S. Acabei de receber o BO por e-mail. Que modernidade! Colocaram que minha cútis é branca e o assaltante aparenta 35 anos.

sábado, 26 de novembro de 2011

Declaração


Ele virou-se pra ela com a maior seriedade que os seus olhos castanhos conseguiam demonstrar. 

Ele estava tremendo e sentia umas sensações pelo corpo que... não era hora de sentir!

Ele pegou a mão delicada dela e colocou-a no seu peito:

— Inês, eu... preciso te dizer uma coisa muito séria.

— Diga — ela falou distante.

— Tá sentindo o meu coração pulando? Pois é. Isso acontece toda vez que eu tô com você. É só você chegar perto de mim que eu... fico bobo, esqueço o que eu ia dizer. Eu perco os sentidos quando você me abraça ou quando eu sinto o cheiro do seu cabelo. Eu achei que... sei lá. Somos amigos, mas a gente não escolhe de quem gostar, né! Pra mim, você era como uma irmã, mas... eu me descobri... apaixonado por você. Eu te amo, Inês! Inês? Inês?

Ela olhava um menino de óculos e blusa amarela que passava.

— Olha que menino bonito!

— Inês, você escutou o que eu disse?

— Ahn... escutei! Escutei até a parte que você disse que tinha alguma coisa muito séria pra falar comigo. O que foi? Você engravidou alguém?

— Não. Eu disse que eu fico... Ah! Deixa pra lá.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Experiências e reflexões sobre a Saga Crepúsculo

 Assistir a algum filme da Saga Crepúsculo no cinema é uma experiência inesquecível. Essa é a minha segunda vez e, como a primeira, eu nunca vou esquecer.

Confesso que já gostei muito da série antes de todo mundo saber quem eram esses vampiros que brilham no sol, mas quando virou essa febre adolescente... Aff! Desanimei demais. Não aguento mais ouvir falar nesses vampiros bonzinhos. Mas precisava assistir aos últimos filmes pra... fechar um ciclo, né.

Em relação ao filme, é um dos melhores da saga. Tem mais de dois anos que eu li “Amanhecer”, então eu nem posso dizer se foi fiel ou não ao livro. Mas, de qualquer forma, a Stephenie Meyer é uma das roteiristas. Ela sabe o que faz.

Se entregar uns spoilers, eu nem vou ser crucificado porque não existe uma vivalma que não tenha lido essa série. Então, vou falar de alguns trechos que não me decepcionaram: o casamento do Edward e da Bella — ele com sua cara sofrida e ela com a cara pangó de sempre —, a lua de mel no Rio de Janeiro — Robert Pattinson falando português com sotaque ficou engraçadinho —, o imprinting de Jacob por Renesmee foi arrepiante e a transformação de Bella em vampira teve uns efeitos legais. Essas partes me deixaram satisfeito de ter pagado a entrada pra assisti-lo. E um destaque pra maquiagem. Troféu Joinha!

A cena de sexo entre os protagonistas, tão esperada pelas fãs recalcadas da série, provocou risos na plateia. Quebrar uma cama e deixar a mulher toda roxa não é algo que se vê todos os dias no cinema. E essa cena também provocou uma discussão acalorada — que ainda tem muitas considerações a serem feitas — sobre as capacidades sexuais do Edward.

Mas o melhor foi o final quando toca a música “It Will Rain” do Bruno Mars.

E, como eu disse no início, assistir Saga Crepúsculo no cinema é uma experiência inesquecível, uma experiência ímpar.

Em primeiro lugar, parece que a Saga incita as pessoas a fazerem comentários no meio do filme.

— Bella, sua vagabunda!

— Por mim você não chora, né!

— Vai ser burra!

— Me morde, Jacob.

— Oh, vida difícil.

— Isso não foi sexo, não.


E por falar em sexo... Tinha um casal no canto do cinema que estava muito assanhadinho, nuns amassos sem fim. Desde o início do filme eles estavam se beijando, mas o negócio foi esquentando, esquentando e eu não conseguia mais prestar atenção no filme. A cena real que tava acontecendo do meu lado tava mais interessante do que a Bella tentando se equilibrar num sapato de salto. Tenho a impressão que eles fizeram o que tinham pra fazer antes de Bella e Edward consumarem o casamento.

Quando eu vi, o menino já tinha jogado uma blusa em cima dos dois, a perna da menina tava pra cima e eu já não tava entendendo aquilo ali. Meu Deus! E até quando os vampiros lutaram com os lobisomens (não me lembro disso no livro), eles não se desatracaram.

E uma menina do meu lado chorando pelo Edward. Oh, meu Pai Eterno! Sai dessa vida, minha filha. Ainda mais o Edward. Hoje eu fiquei pensando como é que as pessoas se apaixonam por um homem estranho daquele.

Edward e Bella são um casal tão sem sal sem açúcar. Desde o início da série, eu torci pra ela largar esse homem branco e frio e ficar com o Jacob. Aliás, o Jacob, mesmo não tendo mostrado o seu tanquinho tão desejado, arrancou mais suspiros do que no filme anterior. Ele tava mais bonito nesse filme. E a Bella ainda prefere um vampiro... Coitado do Jacob.

Em suma, o filme superou minhas expectativas desde quando eu assisti ao trailer. Gostei muito e imagino que as fãs desequilibradas da Saga saíram aos prantos do cinema. 

domingo, 20 de novembro de 2011

Sofomania


[O diálogo não tem nenhuma base científica. É uma representação de diálogos reais.]

So-fo-ma-ni-a - s.f. 1. Afetação de sabedoria; 2. Mania de passar por sábio.

No churrasco:

— E aí, no final do filme, o cara salva a mulher e o filho e foge. Ah! E a casa dele explode. Muito massa!

— Ah, mas é sempre assim: muito previsível. Por esse filme, a gente pode entender um pouco sobre a teoria marxista das classes e toda aquela ideia freudiana da interpretação dos sonhos. A gente vai ver o conceito do individualismo. É a cara dele. E aí, a gente lembra que a cocaína era recomendada por Freud para seus pacientes. Daí que surgiu esse vício que move a tal personagem que morreu no acidente.

— Hã? Freud? Desde quando você lê isso? Você nem sabe que foi Marx!

— Aí, você me ofende. Marx é o filósofo, sociólogo, sexólogo, akpes-Ólogo, fixsga-Ólogo e... Ólogo! É isso. E Freud é o...

O outro o interrompe:

— Olha o que você tá fazendo! Fica falando e não presta atenção no que tá fazendo! Tá cortando a carne tudo errado!

— Calma, calma... Eu sei o que eu tô fazendo. A carne tem que ser cortada nesse rumo do nervo, ó. Você pega a faca bem afiada, segura aqui, assim, e vai passando a faca nesse sentido aqui, ó. Tá vendo?

— Tô, mas... Na verdade, eu nunca vi o açougueiro cortando desse jeito. Quer ver? Me dá a faca que eu te mostro.

— Esse açougueiro aí não sabe de nada — ele diz se afastando com a faca. — Eu fiz Agronomia.

— E tem alguma coisa a ver?

— Claro que tem! — ele diz indignado. E discursa sobre os seus dotes de magarefe adquiridos na faculdade.

O outro decidiu mudar de assunto:

— Fico pensando nos vegetarianos... Coitados, né. Deve ter uma vida tão sem graça.

— Pode até ser sem-graça, mas eles é que estão certos.

— Por quê?

— Uai, os seres humanos são herbívoros. O homem não foi feito pra comer carne. Porque, se o homem fosse feito pra comer carne, seu estômago deveria dar conta de digerir o osso. O ácido do estômago tinha que conseguir corroer o osso da galinha, por exemplo. Que nem no estômago do leão!

— Corrói o osso? Nunca ouvi falar nisso.

— Claro que corrói! O leão come carne, osso e pele. Come tudo! E, se a gente comer um ossinho... Nossa Senhora! E você já percebeu que, quando a gente vai numa churrascaria, a gente fica empanturrado o dia todo? É porque nosso estômago não foi feito pra isso!

— Mas eu lembro que na 3ª série a professora disse que os homens são onívoros. Sabe? Podem comer carnes e vegetais.

— Claro que não. Ela tava errada. Eu fiz Agronomia. Segundo a teoria evolutiva de Darwin, o homem... — e blá blá blá.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Uma trilha



"Tenho 90 anos. Ou 93. Uma coisa ou outra.

Quando temos cinco anos, sabemos até os meses de nossa idade. Mesmo por volta dos 20 sabemos quantos anos temos. Tenho 23, dizemos, ou talvez 27. Mas quando chegamos aos 30, algo estranho começa a acontecer. A princípio, é um mero sobressalto, um instante de hesitação. Quantos anos você tem? Ah, eu tenho — você começa confiante, mas depois para. Ia dizer 33, mas não é essa a sua idade. Você está com 35 anos. E isso o incomoda, pois você fica imaginando se não é o início do fim. Claro que é, mas ainda faltam décadas para você admitir isso.

Começamos a esquecer as palavras: elas estão na ponta da língua, mas, em vez de simplesmente saírem, permanecem ali. Subimos a escada para buscar alguma coisa e, quando chegamos lá em cima, não lembramos mais o que estávamos procurando. Chamamos um filho pelo nome de todos os outros e até pelo nome do cachorro antes de acertar. Às vezes esquecemos em dia estamos. E, por fim, o ano.

Na verdade, não é que eu tenha esquecido. Simplesmente deixei de prestar atenção. Passamos o milênio, disso eu sei — tanto barulho por nada, todos aqueles jovens chiando de tanta preocupação e comprando comida enlatada porque alguém teve preguiça de deixar espaço para quatro dígitos em vez de dois —, mas isso pode ter sido no mês passado ou há três anos. O que importa? Que diferença há entre três semanas, três anos ou até mesmo três décadas de purê de ervilha, mingau e fraldas geriátricas?

Tenho 90 anos. Ou 93. Uma coisa ou outra."

Trecho de "Água para Elefantes", Sara Gruen.