— O que tá acontecendo? Você parece tão... deprimido.
— É. Eu tenho pensado muito sobre algumas coisas nos últimos tempos.
— Tipo...?
— Tenho pensado sobre a minha vida, mas principalmente sobre os meus
sonhos. Fico pensando se algum dia eu vou realizar algum.
— Mas por que você tá pensando isso? Você é tão jovem!
— Mas não serei pra sempre.
— Ai, gente! Então, vamo’ lá! Qual é o seu maior sonho? Algum desses
que você acha que nunca se realizará?
— Assim... Eu sonho em ser um escritor! — disse envergonhado.
— Ótimo! Só não consigo enxergar o problema.
— É que... quando eu digo o meu sonho, como eu acabei de fazer agora,
eu tenho a impressão que ele se torna algo muito irreal. Sei lá! As pessoas
fazem planos de ter um carro, ter um filho, se casarem, ter um emprego fixo e
eu sonho... em ser escritor.
— E o que tem de mais nisso? Um sonho como outro qualquer!
— Não, não é! Eu sinto que ninguém acredita no meu sonho.
— Mas as pessoas não precisam acreditar no seu sonho. Você é a única
pessoa que precisa acreditar nele. Você acredita no seu sonho?
— Muito. Desde quando eu era um menininho. Quando eu aprendi a
escrever, eu andava sempre com um pedaço de papel e um lápis. Enquanto os meus
primos brincavam de bola, eu tava sentado na sombra escrevendo alguma coisa.
— É um lindo sonho, Lucas! Você deve dar continuidade a ele. Agora, me
responda: o que você está fazendo de concreto para realizar o seu sonho de
publicar um livro?
— Bem... Pelo menos, eu tenho a consciência de que eu tenho praticado
bastante.
— E você espera que alguém descubra algum dos seus textos escondidos
no seu computador ou nos seus cadernos de anotação?
— Não. Eu sei que isso não vai acontecer, mas... É que eu tenho medo.
— De...?
— Medo de ser criticado. Eu não sei se os meus textos são bons. Eu
tento escrever o melhor possível, mas... eu nunca estou satisfeito!
— Isso acontece porque você é muito exigente consigo mesmo.
— E eu também fico pensando que existem tantas pessoas melhores que
eu. Não sei se eu tenho chance de algum dia vender alguma coisa.
— Que pessimismo! É claro que seus textos são bons!
— Quem disse isso? Meus amigos? Minha professora da quarta série?
— E a opinião deles não vale?
— Vale, mas... é que nem quando a minha mãe diz que eu sou bonito. Às
vezes, as pessoas mentem para nos agradar.
— Você é muito exigente mesmo! Então, você quer que os críticos
aceitem os seus textos, que façam resenhas efusivas para aparecer na capa do
seu livro e que eles sejam traduzidos para 40 idiomas, mesmo que você não
conheça 40 idiomas?
— Eu adoraria, mas... isso nunca vai acontecer. O meu jeito de
escrever não vai agradar a ninguém.
— Como você sabe? Tem um monte de autores que você gosta que outras
pessoas detestam. E vice-versa! Você se lembra do Visconde de Taunay? Você
gostou de Inocência, mas ninguém mais
gostou. E o Oswald de Andrade? Você não diz sempre que passou mal com o Memórias Sentimentais de João Miramar
por ele ser tão ruim, enquanto ele é considerado um marco para a literatura
moderna?
— É verdade, mas...
— E o Guimarães Rosa? Você chorou com o Sagarana, mas no ano passado você leu uma crítica falando horrores
do jeito de escrever dele.
— E fiquei indignado!
— E ainda tem os livros de auto-ajuda! Os livros do Augusto Cury
vendem milhares de cópias, enquanto você e várias outras pessoas dormem
enquanto leem os conselhos dele.
— Onde você quer chegar com isso?
— Quero dizer que ninguém consegue agradar gregos e troianos! Stephen
King, Machado de Assis, Paulo Coelho... Você conhece pessoas que idolatram e
outras que odeiam esses autores. Você acha que você é superior e agradará a todos? Eu sei que você já pensou
várias vezes que, se um texto seu tocar só
uma pessoa, você já ficará satisfeito.
— E como você sabe disso?
— Porque somos a mesma pessoa.
— É mesmo. Mas, mesmo assim...
— Ai, Lucas! Vamos continuar essa discussão depois. Eu tô morrendo de
sono e amanhã temos um livro pra escrever.
Um comentário:
Que diálogo interno interessante! Também tenho tido alguns nesses estilo sobre sonhos.
"Mas as pessoas não precisam acreditar no seu sonho. Você é a única pessoa que precisa acreditar nele." Ótima frase para perseverarmos naquilo que acreditamos!
Beijo, Lucas.
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