Ou A desgraça tem
graça
Thaís era uma piadista nata! Era filha de uma professora com
um caminhoneiro e tinha mil histórias pra contar. Todos tinham a impressão de
que Thaís era sempre bem-humorada: achavam que sua vida nunca lhe era difícil,
que ela nunca chorava, que tudo pra ela estava bom. Em grande parte, era isso
mesmo!
Ela gostava de tirar sarro de todas as más situações que a
vida lhe colocava, seguindo aquele ditado que dizia que se a vida lhe desse as
costas que você desse um chute na bunda dela. Até as contas atrasadas dela eram
motivo para piadas!
E Thaís, de certa forma, gostava de se fazer de palhaça: gostava
de contar o quanto a vida brincava com ela e ela conseguia contornar tudo
aquilo com muito bom humor. Gargalhando sempre! E, se você resolvesse falar das
suas lamúrias para Thaís, ela faria graça da sua desgraça. A desgraça tem
graça!, ela sempre dizia. Alguns diziam que aquilo era ótimo para levantar
nossos humores abatidos; outros achavam aquilo inconveniente e ofensivo da
parte dela.
Thaís, então, foi convidada para uma festa numa boate
badaladíssima da cidade. Foi com pouca coisa no bolso porque aquela noite ela
prometia que viraria todos os goles de álcool que aguentasse: eu quero esquecer
meu nome, ela gritava rindo. Toda arrumada para dançar e beber a noite toda,
ela entrou no carro de uma amiga! Cantaram juntas durante todo o caminho.
A festa foi ótima: rock, vodka, tequila e garotos! Fechariam
a noite com um McDonald’s como era de costume. Drive Thru 24 horas! A fila de
carros estava imensa àquela hora da madrugada, quando todo mundo decidia
arrebatar a noite com sanduíche, Coca-Cola e batata frita.
Por ali, um homem maltrapilho carregava um saco de panos
sujos nas costas e aparecia do lado dos carros pedindo, em todos os vidros
abertos, dois reais para comprar um salgado porque ele tinha morado na rua
durante nove anos passando fome, frio e necessidade; tinha, enfim, conseguido
uma casa pra alugar, mas ainda não tinha nem fogão nem panela pra fazer comida.
Ele não tava bêbado nem drogado (e enfatizava isso!): só queria comer.
Quando falou todo o seu discurso ensaiado para Thaís, ela
riu e soltou:
— Moço, eu não tô tendo nem pra mim. Eu é que tô precisando
de uns duzentos reais pra pagar minhas contas. — A amiga (bêbada!) também caiu
na gargalhada.
O homem não riu e finalizou:
— Olha se isso tem graça!
Apontou um revólver para a testa de Thaís e puxou o gatilho.
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