domingo, 22 de abril de 2012

Fogo e Gasolina



— Ele faz isso  pra me implicar. Eu tenho cer-te-za!

— Calma, Gisele! — minha amiga me dizia. Eu detesto quando alguém pede para eu me acalmar, quando, na verdade, eu quero é cometer um assassinato. — Isso aí é coisa da sua cabeça. Essa sua paranoia não existia quando vocês ainda namoravam!

— Essa paranoia não existia porque o Mateus ainda não tinha comprado essa... essa... Como é que é o nome?

— Guitarra.

— Isso! Guitarra. Olha que barulheira! Eu não tô ouvindo a minha própria voz. Parece que o prédio vai cair! Eu vou lá no apartamento dele agora. Ah, mas vou mesmo. Você vem comigo?

— Não muito obrigada. Prefiro ficar aqui. Tô cansada desse joguinho de gato e rato entre vocês dois.

Eu sempre estou sozinha mesmo.

Subi dois degraus de cada vez e bati na campainha do 802. Bati de novo, mas o barulho da guitarra era demais. Resolvi chutar a porta. O som da guitarra parou e Mateus apareceu na porta de bermuda e sem camisa. Aquela bermuda eu tinha comprado no nosso 7º mês de namoro e aquele abdômen... O Mateus tá malhando?

— E aí, Gisele? Tudo bem?

— Tudo bem uma ova!

— Que que aconteceu? Lembrou que tem mais alguma coisa que você esqueceu aqui no meu apê? Calcinha, chaveiro ou marca-página? O que foi da última vez, mesmo...? Ah, lembrei! Uma cartela de adesivos.

— Não. Dessa vez eu vim aqui pra... pra... Mateus, você pode colocar uma camisa pra gente conversar?

— Não posso. Fala logo que eu preciso voltar pro ensaio.

— Então, vou ser rápida e direta: é justamente sobre esse ensaio que eu vim falar com você. Esse barulho tá fazendo tremer o meu apartamento e tá me atrapalhando a dormir, sabia?

— Não, não sabia. Mas... já que tá fazendo tremer o andar de baixo, porque você não vem pra esse andar. Tem um quarto vago aqui no meu apê e a gente pode... conversar até tarde...

— Por que você está tão próximo? Mateus, você pode se afastar de mim, por favor? Você... tá me encostando!

— Isso te incomoda?

Filho da mãe! Ele tava usando aquele perfume que tem cheiro de homem.Como é mesmo o nome dele? Ah, não lembro. Era alguma coisa com Z. Sei lá! E ele tava respirando no meu rosto. O hálito dele é uma coisa admirável. Não é só porque eu faço odonto que eu fico reparando essas coisas, mas eu admiro o Mateus por ele nunca ter fumado.

Peraí! Ele tá me pressionando contra a parede. É isso mesmo? Gisele, Gisele! Não tenha uma recaída. Você está sendo forte. Já resistiu três semanas sem o Mateus. Claro que durante essas três semanas já houve quatro reaproximações com beijos e amassos. Ou foram cinco? A última foi na semana passada.

— Não é que me incomoda, Mateus, mas... a gente... nós... eu...

Ele tá me beijando? Meu Deus! Por que ele tá me beijando? E por que eu tô retribuindo? Nossa, mas o Mateus beija bem! Eu tinha me esquecido que... hum... Nossa, que pegada é essa que não existia até semana passada?

Minha cabeça tá girando, gente! Que loucura. Esse negócio de fechar o olho não funciona muito bem comigo. Tenho labirintite. Peraí! Que lugar é esse?

— Mateus, a gente tá no corredor!

— Prefere lá dentro?

— Quando é que você limpou esse apartamento pela última vez?

— Não se preocupe, a dona Rosa veio aqui ontem. Tá tudo em ordem.

— E seu ensaio?

— Eu não tenho guitarra! É um CD que eu comprei no camelô.

— Mateus... Fique sabendo que essa será a última vez.

— As últimas vezes sempre foram as melhores.

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