sábado, 13 de fevereiro de 2010

Nunca fui beijado

A turma com que Inácio andava sempre questionava-o sobre seu poder de conquista. Nenhum dos três garotos daquela turminha de amigos tinha visto Inácio com uma garota (nem com um garoto). Começaram até a desconfiar da masculinidade do rapaz.

— Tá mudando de time, Inácio!

Inácio sempre desconversava dizendo que eles nunca o viram com uma garota porque...

— Porque... porque vocês nunca estão nos lugares certos nos momentos exatos.

A turma acabava mudando de assunto, mas aquilo ficava rodando na cabeça do coitado do Inácio. Era um segredo que ele tinha guardado durante tanto tempo. Achava que era normal, que algum dia aconteceria espontaneamente, mas nunca acontecera. Inácio era a única pessoa no mundo que sabia da sua situação: ele nunca tinha sido beijado. Talvez seja romântico demais dizer “nunca foi beijado”, mas a verdade era essa, nua e crua.

Um dia cansado de sua situação de seca e da zuação dos amigos, Inácio resolveu provar para eles (e para si próprio) que era capaz de beijar uma garota.

— Está certo, então! — um dos garotos disse. — Amanhã na boate perto do shopping.

Inácio achou que era pouco tempo para se preparar, mesmo assim disse que estaria lá.

— Nós vamos escolher as garotas e vamos ver seu poder de sedução — Lúcio disse quando chegaram na boate, acompanhado das risadas dos outros.

Lúcio apontou para um morena, de cabelos lisos, dançando junto de outra amiga.

Inácio hesitou, mas... foi.

— E aí, gata! — Inácio sabia que aquelas palavras não cabiam na boca, mas foi obrigado a dizer por conselho dos amigos. — Quer tomar uma bebida?

— Quero. Eu tomo uma cerveja e você um chá de sumiço.

Inácio queria enfiar a cabeça debaixo da terra. Não sabia o que era pior: o “fora” da garota ou a zuação da galera.

— Calma, Inácio! Calma! — Marcos dizia. — Você tem que ser mais poético.

“Mais poético… mais poético…”, e Inácio ia pra pista de novo e a galera atrás.

— Oi! Seu nome é Tamara?

— Não. — Inácio até sorriu. Pelo menos ela se interessou pela conversa. — Por quê?

— Porque você Tamaravilhosa!

A menina revirou os olhos e saiu para o outro canto da pista. A galera se dobrava de tanto rir.

— Agora é a vez daquela ali! — Lúcio apontou para uma garota no meio da pista.

— Lúcio, mas aquela é mais feia que briga de foice no escuro.

— Tudo bem! Vou ser bondoso com você! — ele olhou em volta. — Aquela ali, então. — Ele apontou para uma loira que virava o líquido de uma garrafa goela abaixo.

Inácio foi na fé.

— O que você tá bebendo, gatinha?

— Ice.

— Ice eu te pego.

A garota vomitou no chão. Ninguém sabia se era pela bebida ou pela qualidade da cantada. A turma morria de rir.

— De onde você tira essas pérolas? — Victor perguntou com a mão na barriga de tanto rir.

— Já vi a próxima vítima — Marcos gritou.

Ela estava dançando enlouquecidamente.

— Vê se não usa esses seus trocadilhos!

Inácio atravessou a pista decidido. Os outros três não conseguiram nem acompanhá-lo direito.
Pensaram que ele ia usar uma pior ainda e estava com vergonha.

Ele chegou perto da moça e começou a dançar. As luzes o tonteavam, mas ele continuava.

— Você tá sentindo um cheiro de tinta? — ele gritou.

— Não — a moça respondeu. — Por quê?

— Porque tá pintando um clima no ar…

Inácio sentiu que o rosto da garota se aproximou. Sentiria o gosto do primeiro beijo. Faria média
com a turma…

Não era nada disso. A moça tinha lhe reconhecido. E ele também. Sua prima, Laura.

— Você por aqui?

Inácio sorriu amarelo.

— Pois é.

Inácio tentou achar os outros. Viu que eles estavam mais adiante com cara de “não estou entendendo nada”. Ele percebeu que dali eles não ouviriam nada. Tomou a decisão. Segurou na cintura da prima.

— Eu tô com a turma da escola aqui e eles querem que eu beije alguém, mas eu não pego nem resfriado. Me beija agora ou eu conto pra sua mãe os lugares que você frequenta, priminha.

Ela ficou com uma cara de brava. Inácio achou que ela fugiria. Fez aquela cara de piedade e Laura entendeu a situação. Sabia como eram os adolescentes. Inácio, provavelmente, tinha sido até interrogado sobre sua masculinidade.

Ela beijou-o.

Inácio sentiu o gosto do primeiro beijo. Não era com quem ele esperava. Conhecia Laura desde criança. Sua mãe conhecia Laura desde criança.

O importante é que tinha cumprido sua missão e a galera agora respeitava o pegador do pedaço.

6 comentários:

Anônimo disse...

O máximo!

Unknown disse...

Todo mundo passa por uma situação constrangedora na adolescência. Levar 'tocos' é uma delas.

Gabrielle Pires Silva disse...

Morri de rir das cantadas
dos trocadilhos. Me lembrou um amigo meu
da escola hahaha, muito divertido
que bom que ele beijou, que pena q nao foi bem
como ele esperava. ir de pilha é a pior coisa
que se pode fazer em tal situação

mas ta mt bom o texto. adorei o blog bjs

Charles Bravowood disse...

UHAUHA, ótimo, viu! Inácio o pegador do pedaço, uahua, ri demais, as cantadas dele eram péssimas, mas hilárias, fato.

Abração moço,
Até.

Charlie B.

Thai Nascimento disse...

É uma pena não ter sido da forma que ele esperava, mas apenas o resultado da pressão dos "amigos". Amigos de verdade não pressionam, mas respeitam os outros. E, sinceramente, "pegadores" não enchem os meus olhos.

Ps: não conhecia essas cantadas-trocadilhos. Engraçadas, de fato, são.

Boa sorte no BK.

Felicidade Instantânea! disse...

Ah gostei! =D


Ps: estou te seguindo.