sexta-feira, 2 de julho de 2010

O padre holandês

O casamento tinha sido marcado para aquele dia às 11 horas da manhã. Já era dez e meia e só uma meia dúzia de gente tinha chegado ao casamento: contando com os pais dos noivos e um padrinho.

— Que ideia é essa de marcar o casamento no horário do jogo? — Guilherme, o padrinho, perguntou ao noivo. — Será que não tinha outro dia pra marcar esse casamento? Tinha que ser no dia do jogo do Brasil. No mesmo horário.

— Olha aqui, Guilherme — Danilo, o noivo, retrucou. — Foram eles que marcaram depois. Meu casamento tava marcado desde antes do sorteio dos grupos da Copa.

— Você tá se achando muito importante, né? Tá achando que a FIFA tá de marcação com você.

— Oh, Guilherme, você é o padrinho. Você não pode ficar me colocando mais nervoso do que eu já tô.

— Será que não dá pra adiar pra mais tarde, Danilo? — Guilherme perguntou quando mais um convidado entrou.

— Adiar? A Rafaela me mata. Já segurei esse namoro por cinco anos. Se eu disser pra ela que o casamento vai ser adiado… Ih! Eu nem sei se eu vou viver pra contar o que vai acontecer. E, também, a viagem pro sul de Minas já tá marcado pra hoje à tarde.

— Só sei que eu tô morrendo de vontade de assistir ao jogo. Brasil e Holanda… — Com pesar. —
Nem sei quando será a próxima vez…

A noiva não tinha chegado quando o relógio da igreja deu onze badaladas.

Começa o jogo.

Os convidados ligaram os celulares com os fones nas orelhas. Tinha só uns vinte convidados. Os mais íntimos.

O padre holandês estava morrendo de tanta ansiedade.

— Cadê a sua noiva?

Aquele momento de tensão. O jogo já tinha começado e a Rafaela tinha sumido.

Era pouco mais de onze horas quando os convidados gritaram gol.

— Gooool! Foi o Robinho.

Na verdade, foram duas vezes. Mas uma foi anulada.

O padre chamou o coroinha. Ele não apareceu. O sacristão? Também não estava ali. Foi o próprio padre que entrou na sacristia e ligou o rádio no circuito de som da igreja.

— O que é isso, padre?

— Só enquanto a noiva não chega.

A noiva chegou quando estava no meio do primeiro tempo. O padre diminuiu o volume. Nem os convidados, nem os padrinhos queriam perder o jogo. Mas tinha que haver o casamento. E tinha que ser hoje.

O padre falou mais uma meia dúzia de palavras. Perguntou pra cada um se eles aceitavam o outro de livre e espontânea vontade e blábláblá.

Tinha um fotógrafo que ficou responsável pelo casamento, mas nem prestava atenção em nada.
Seu fone estava conectado no Galvão Bueno.

— Coloquem as alianças e pode beijar a noiva.

Segundo tempo do jogo.

As fotos com os padrinhos, os irmãos dos noivos, os pais dos noivos… O padre tava num cantinho da igreja com os ouvidos colados num radinho.

Ele gritou gol sozinho quando a Holanda marcou o primeiro. E depois o segundo.

Ninguém mais queria saber do padre.

Todo mundo jogou uma mãozada de arroz num desânimo danado quando o Brasil já tinha sido eliminado. Os convidados deram uns parabéns desanimados e os noivos entraram no carro. O motorista tinha sumido. Danilo foi dirigindo, mesmo.

— Pra completar — Guilherme disse quando os noivos já tinha ido, — nem vai ter festa.

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