Umas semanas atrás eu
entrei num desses botecos de esquina onde a clientela é exclusivamente
masculina. O dono do bar, um nordestino de uns 70 anos, conversava animadamente
com um homem moreno; a conversa parecia agradável: os dois riam alto e
gesticulavam muito. Estiquei o ouvido para escutar: um narrava para o outro uma
briga entre Max e Jorginho em Avenida Brasil.
Voltei pra casa sorrindo e
pensando se aquela cena seria imaginável há 20 anos. Hoje, as novelas
tornaram-se entretenimento de todos: não existe mais o futebol do patrão e a
novela da dona-de-casa. Milhões de pessoas se sentam na frente da televisão
para ver a infinita guerra entre mocinhos e vilões. Mas Avenida Brasil vai
muito além disso.
A quarta novela em que João
Emanuel Carneiro é o autor titular tem uma vilã carismática, uma mocinha que
age fora dos padrões do politicamente correto, um herói ingênuo, um homem com
três mulheres, além de uma série de outros personagens de caráter duvidoso. Mas
nada disso é questionado pelo público: só queremos ver as peças de movendo no
tabuleiro e torcer pelo amor ou pela vingança.
Nas duas últimas semanas
(desde que Nina jogou uma jarra de suco em Carminha e o Max descobriu quem era
a Rita) Avenida Brasil tem enlouquecido o público: as redes sociais estão
lotadas de fotos congeladas e opiniões diversas sobre as ações das protagonistas.
O tão aguardado capítulo 100 (que foi ao ar na última quinta-feira) valeu a
pena.
Entre a minha família não
se fala em outra coisa. É preciso conhecê-los para entender que o nosso assunto
favorito é televisão. Nas reuniões de família as discussões são animadas e é
preciso um pouco de juízo para que tudo não se transforme em briga. Nos nossos
almoços é obrigatório que façamos uma análise da trama: desde “a vingança
compensa?” até temas mais leves como a sexualidade do Roni ou a traição da
Olenka. Tentamos descobrir os próximos acontecimentos e narramos com riqueza de
detalhes (cenários, roupas e diálogos) as nossas cenas preferidas. E se alguém
perdeu algum capítulo... o site da Globo tem todos os vídeos disponíveis.
É claro que Cheias de
Charme e Gabriela também rendem boas conversas pela internet, nas mesas de
lanchonetes ou dentro dos ônibus, mas Avenida Brasil é o que podemos chamar de
fenômeno. Antes dela poucas outras fizeram tanto estardalhaço (talvez porque as
redes sociais ainda não tinham tanto público): lembro-me de O Clone, Senhora do
Destino e A Favorita (essa última também do João Emanuel).
Interessante que todas
essas histórias conquistaram o público principalmente pelas paixões reprimidas
do povo: amores proibidos e sede de vingança. Quando nos falta coragem, os
personagens da ficção são os responsáveis por satisfazer nossos desejos. Por
isso que as cenas onde a mocinha estapeia a vilã (Celebridade, Senhora do
Destino, Caminho das Índias, Avenida Brasil) fazem tanto sucesso.
Avenida Brasil ainda tem
muitos capítulos pela frente e, pelas minhas reflexões e previsões, a novela
ainda terá outra virada espetacular como a da última semana: comprarei um
desfibrilador pela internet. João Emanuel Carneiro consolida seu lugar na Rede
Globo como a galinha dos ovos de ouro e Avenida Brasil já é a favorita
(trocadilho infame) de muita gente. Os anunciantes riem de satisfação e
Aguinaldo Silva chora de inveja.
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