Quem está acostumado com os romances policiais sabe um pouco sobre a psicologia do criminoso. Sabem que quando o criminoso se safa do seu primeiro crime, se acha muito esperto para cometer outros. Mas todos os crimes são diferentes.
Sorte do Júlio se alguém tivesse lhe isso.
Júlio era conhecido na escola inteira como o melhor “colador” do lugar. O garoto era considerado um artista na arte de colar em provas. Todas as suas estratégias eram copiadas e, quando se tornavam obsoletas, caiam em desuso, ele inventa novas técnicas inovadoras.
Todos os experts em colas sabem que a arte de escrever pequeno é muito importante para quem não estudou em casa. Júlio aprendeu isso quando ainda estava no Ensino Fundamental. Resolveu usar essa tática por incentivo de um amigo. Era a primeira vez que colava. A Revolução Francesa não lhe entrava na cabeça.
O papel era um pouco mais que uma embalagem de balas e quase toda a Revolução Francesa estava descrita ali. Júlio ficou arrasado quando levantou a cabeça e a professora observava-o lendo aquele papelzinho. Foi a primeira vez que levou uma advertência. Ocorrência, como preferir.
Júlio jurou para si mesmo que aquilo não aconteceria mais. Que ele era mais esperto que aquelas professoras e que a orientadora não precisaria vê-lo por muito tempo.
Foi na época em que estudavam a Primeira Guerra Mundial que Júlio resolveu usar sua tática mais simples. Coisa de principiante, mas infalível. Copiou datas, lugares, nomes, fatos… Tudo no braço. No dia da prova, ele usou blusa de frio, manga comprida, e na hora da distração da professora, ele arregaçava as mangas e lia toda a matéria. A professora nem desconfiou. Era seu primeiro “crime” impune.
Ele usou essa estratégia durante algumas provas. Logo, ele percebeu que seus colegas de classe o imitavam. Ele passou a ser admirado pelo plano tão simples, mas que ninguém havia pensado antes. Júlio começou a se achar mais esperto que os outros. Era mais esperto que os colegas e, o mais importante, que as professoras. Ele podia fazer aquilo eternamente sem punição.
Decidiu que precisava inovar.
Era a hora de usar um relógio oco. O relógio e arte de escrever pequeno. Toda a Revolução Russa descrita naquele pequeno papel. Trabalho de uma tarde inteira. No momento em que alguém (sempre existia um alguém) chamava a professora para tirar uma dúvida, era hora de acionar o botão e a cola cair sobre a mesa. Mais uma vez Júlio se safou. E todos os seus colegas queriam o tal do relógio oco. Nem que fosse de plástico.
Sua fama se espalhou pela escola. Foi aí que Júlio começou a perceber que a vigilância das professoras era maior sobre ele. Mas elas não viam nada. Júlio ria quando pensava nas conversas nas salas dos professores:
— Eu não sei como ele cola! — a professora dizia, indignada.
O tubo da caneta Bic também foi usado. Um papel enrolado no tubo de tinta da caneta.
Depois foi a hora de usar o colega da frente. Um papel colado nas costas do amigo da frente. Era só um movimento do outro para Júlio conseguir enxergar as respostas.
Depois de muitos estratagemas tão arcaicos, a Era Tecnológica chega para ajudar os coladores profissionais.
O celular era posto na cadeira de uma maneira que, abrindo as pernas, era possível enxergar a tela quadrada do aparelho. A primeira vez foi com aquela mesma técnica de antes: a matéria escrita do início ao fim.
Mas a tecnologia teve mais lados positivos: os nerds começaram a gostar da brincadeira. Eles sabiam as respostas, escreviam nos seus celulares e distribuíam para todos os amigos. Júlio não era o mais querido dos nerds da sua turma, por isso precisava de outra maneira de arranjar respostas dos outros. Fácil! Ele mandava a pergunta pelo celular para alguém de fora que segurava um livro de história. Mole, mole!
Júlio ria, imaginando a professora corrigindo sua prova;
— Ele não colou! Eu tenho certeza! Ele é mesmo muito estudioso.
Os celulares evoluíram. A sensação — criada por Júlio, obviamente, — era tirar a foto da prova inteira, mandar uma mensagem para alguém fora da sala, que tivesse condições de pesquisar, e tirar dez na prova.
A confiança de Júlio foi seu erro.
Na hora de mandar a mensagem com a foto da prova errou o número. Não era possível que Júlio fosse tão azarado. Era apenas o destino.
A mensagem chegou às mãos — ou melhor, celular — da orientadora da escola. Nem preciso citar o quanto foi fácil descobrir quem era o remetente.
Júlio foi punido. Sentiu-se humilhado. Era horrível aquele rebaixamento moral. Nunca mais seria o mestre das colas. O posto de melhor “colador” foi pra outro aluno. E o pior: seus pais foram avisados.
Alguém deveria ter lhe dito que todos os crimes são diferentes. Ou que estudar é mais fácil que arranjar uma forma de escrever toda a matéria num papel.
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